sexta-feira, 29 de março de 2013

Almoço grátis

Um castelo de cartões de crédito,
Que sustentava o mundo, desabou com o vento.


O escalafobético e a borboleta

Hoje. No fundo do agora incidental. Em toda sua esquizofrenia e realidade. Este segundo. É um segundo total.


Se não fosse pela desatenção em assistir o entreabrir da tua boca.



domingo, 24 de março de 2013

Desilusão



O zeta se aproxima
De cima em linha reta

No cataclismo disfarce
Da faca, da face

No hiato dos lábios
Em tempestade solar

Para selar o consolo
E desiludir o trôpego pulso
Em alta pressão

Porque a água que limpa
É também a que afoga
Os afagos guardados no coração

E no seco gole da saliva
Raiar um sol indiferente
Que te liberte do disfarce
Do falso sorriso entre os dentes
Da faca, da face
Da farsa e da foice

Contar a realidade
Por baldes de água fria
No pôr solar da cidade
O que é é não ser o que seria

E por definição
O horizonte alheio
Fazer brotar em teu seio
A epifania da morte da ilusão.





quarta-feira, 20 de março de 2013

Aluno

Na borda daquela velha caneca, eu imaginei o teu batom mais baixo. E abri o livro feito tuas pernas. Era de poesia, como os teus olhos. Era em japonês... e era breve. Dizia assim a tradução:

Zombe da penumbra
A desilusão consola
O que o amor esclareceu


Lembrei-me de quando te esquecia. E, de repente, me esqueci de como não entendia nada de você..


terça-feira, 19 de março de 2013

Aluno (escancarado)

Poder poluir o papel branco
E delinear a melodia que suprime o inaudível barulho do caos
Ressoar na frequência que chamam de silêncio.

E o silêncio, o papel branco.

Desamparar-se do barulho
E do que falta entre as certezas escancaradas de um sorriso.

Fingir pode ser ser.
Abro um livro como as tuas pernas.
Bacanalizo o barulho que transborda de tua respiração.

E dizem que o branco opaco do muro representa a liberdade.

O ledo engano do artista.




quarta-feira, 13 de março de 2013

Gônada

Ler com os dedos
O braile do teu corpo.
Lamber o delta do teu sexo
Liquefazendo o teu plexo.
Fazer brotar do ovo
E germinar tudo de novo.


domingo, 10 de março de 2013

Predador

Chegada a hora, estava preparado. Era sua prova de fogo. Retornaria com o crânio a tribo, após aquela temporada vivendo em plena solidão. Passou luas à espreita, e fazia parte do rito assistir o nascimento e crescimento da caça até que no momento certo, quando o animal estivesse em pleno equilíbrio de forças consagraria a comunhão de sua morte numa luta justa. Fazia alguns sóis que perdera a fera de vista. E sabia, de alguma forma, que naquela tarde chuvosa se daria o derradeiro encontro. Seu olhar era fixo e, no cair do sol, pressentiu o fitar oblíquo da pantera, que já se camuflava junto à noite. Imóveis, se entreolharam sob a fina chuva. A observação durou até que houvesse apenas dois círculos dourados que flutuavam na escuridão. No transe de um instante, um relâmpago desenhou a silhueta do animal. E antes que o trovão pudesse bravar, ele sentiu pulsar a floresta pelas veias e a sua própria mandíbula penetrar em seu pescoço. A presa estava morta.



Antropomorfina

Uma palavra hermética
A comicidade onde vivo...
De repente, num deslize,
O minotauro me pisca de soslaio.


sábado, 9 de março de 2013

Necessidade e preguiça

A necessidade me levaria a escrever
bíblias de tristeza
estantes sobre o amor
livrarias da condição humana

A preguiça me arrebata
E o universo se condensa num verso.


quarta-feira, 6 de março de 2013

Velado

É teu aniversário. E supostamente deveria dizer alguma coisa. Obrigo-me a dizer qualquer coisa, inclusive dizer que não me esqueci dele. Mas sobretudo que tudo que disser será banal, frente a tudo o que poderia ter dito. Dessa forma, como se pudesse velar o silêncio. E como se o silêncio não fosse um gesto absoluto. Eu o entrego. Não o vulgar, mas o apraz silêncio entre o olhar e o horizonte. O silêncio com os pés afundados na areia, e o mar batendo ao tornozelo. Para o teu bem, um silêncio ensolarado de desejo, de palavras por dizer.


sábado, 2 de março de 2013

Sacrifício

por debaixo da saia da ciência
por entre a cerca
a plantação de carros
E a mecânica da natureza
os sons que me asseguram que as coisas existem que me acercam
enquanto que Morre deus
no hecatombe dos eus
que me acercam e me são

sexta-feira, 1 de março de 2013

Santa Sebastiana do Rio de Janeiro

Beira abril
No coração aberto
Sob a sombra
Do mormaço
Tua raça de perfil
E teu balanço incerto
Tua beleza que sobra
O quadril do Brasil.


Epífano

Eu despontei num mar de estrada
As léguas de um infinito e meio
E no domínio completo da simplicidade
Dei por mim nessa cidade
Qual um qualquer que sabe nada
Fiz do pranto um ponto
final.

(em que afinei meu verso pra continuar seguindo)