Refestelava-se das sobras que havia guardado. Era o quinto dia desde a morte da figura grotesca. E ele fazia de tudo para aproveitar ao máximo sua carne antes que ela apodrecesse.
Empanzinado dos pedaços já rançosos, ele olhava para o deserto e não saberia dizer quando poderia se alimentar novamente ou se, de algum modo, poderia sobreviver por mais alguns dias naquela clareira inóspita.
O sol, que começara a se pôr há duas semanas, completaria seu translado em poucas horas. O céu sustentava um laranja metálico e a paisagem anunciava o frio implacável que estava por vir. No outro polo do horizonte, a escuridão se descortinava, enquanto um dos olhos era deglutido calmamente.
Para sobreviver a Noite dos Mil Dias era preciso se mover, e assim o fez. Começou sua procissão pelo deserto arrastando a carniça do monstruoso gigante. A cada jornada seu fardo se tornava mais leve.
Depois do sexto dia, nada mais era visto, a não ser a parca luz das estrelas. Não poderia saber se elas também estavam mortas, mas o brilho delas o alimentava tal qual o corpo apodrecido do gigante. De alguma forma, ele sabia que estava na direção certa, mesmo sem saber com precisão para onde ia, ou se ainda havia do que fugir.
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